Por Anamaria Bacci, jornalista e tradutora da G&M News.
Por que o senhor decidiu apresentar uma proposta de legalização geral do jogo no Brasil, incluindo não só os cassinos, mas também outras variáveis? Por que acha que o jogo legal pode contribuir para o país?
Na minha opinião, a abrangência da legalização do jogo precisa ser a que beneficie a maior parte da população. Com a legalização de todos os jogos à maneira que proponho em meu relatório ao PL 2.648/2019, de autoria de Roberto Rocha (PSDB-MA), possibilita-se a criação de mais de 600 mil empregos formais entre cassinos, jogo do bicho, bingos, caça-níqueis etc.; a arrecadação de mais de R$50 bilhões, uma fonte de recursos para beneficiar mais de 22 milhões de famílias com benefício mensal de R$300,00; uma forte fiscalização operacional e financeira aos exploradores desses jogos; e o incentivo a políticas públicas para o jogo responsável, impedindo o jogo por pessoas com ludopatia.
Quais são os motivos pelos quais um mercado gigantesco como o Brasil ainda está em desacordo com o que está acontecendo no mundo em termos de oferta regulada de jogos? Como trabalhar junto com adversários como a Igreja ou alguns políticos locais, que continuam tendo uma imagem negativa do jogo e não entendem o avanço da ilegalidade?
Esse é um ponto importante: o Brasil é uma exceção quando se trata de legalização de jogos. No Mercosul, o Brasil é o único a não ter o jogo legalizado; entre as 20 maiores economias do mundo, apenas 3 não legalizaram os jogos: Arábia Saudita, Indonésia e Brasil, sendo as duas primeiras por motivos religiosos. Há, no Brasil, uma falsa impressão de que o jogo não existe e que se passar a ser legalizado, a ludopatia vai aumentar. Acontece que o jogo ilegal no Brasil já ultrapassa em faturamento o jogo legal e não há políticas públicas para combater esse mal e nem a arrecadação de tributos que podem beneficiar outros segmentos da sociedade. Para ser legalizado, o jogo precisa de uma regulação sólida, com atuação dos órgãos competentes, com restrição de quem pode prestar a atividade e com o monitoramento do dinheiro.
Quais os estados ou territórios do país que considera mais favoráveis para a instalação de cassinos e a divulgação de uma oferta atraente do jogo?
Esses cassinos seriam instalados em resorts, complexos integrados de lazer que contêm locais para eventos culturais e artísticos, restaurantes, bares e centros comerciais. Essas instalações poderiam não só trazer o turista para o Brasil, mas retê-lo por mais dias. A Bahia, meu Estado, certamente é uma forte candidata a receber tais empreendimentos. Eles são uma importante fonte de receita, mas de longo prazo. Estimo que entre construção, licenças ambientais, licenças de funcionamento, aprovação de regulamentos, interligação de sistemas e efetiva operação de cassinos, se passem anos. O ideal era que os cassinos fossem instalados em regiões mais pobres de modo a reduzir a desigualdade de renda. Acontece que a viabilidade de tais negócios depende de proximidade de aeroportos, de alta renda per capita e de um mercado consumidor grande, o que pode restringir a implantação desses cassinos de maneira espalhada.
Como o senhor vê a situação da loteria nacional e das loterias estaduais? Como esse sistema deve ser melhorado?
A loteria nacional passou por uma modificação importante nos últimos anos, a possibilidade de apostas por meio eletrônico. Isso é uma tendência que deve ser seguida pelas demais modalidades de loterias para facilitar tanto o acesso do cidadão, como para deixar os sistemas mais eficientes. Ressalto que não está no escopo do meu relatório alterações na loteria federal e nem nas loterias estaduais.
Se o jogo for regulamentado, qual acha que deve ser o percentual de imposto a ser cobrado pelo Estado para cada atividade?
Em primeiro lugar, o importante é deixar a tributação mais equânime entre os competidores desse mercado. Não se pode deixar, por exemplo, a Caixa pagando 20% de CSLL e os demais participantes com 9% (visto que as instituições financeiras passaram a recolher 20% de CSLL após a reforma da previdência). Por outro lado, a contrapartida, à sociedade tem que ser suficientemente grande para ficarem bastante claros os benefícios que a legalização dos jogos trará ao país. Por isso, proponho aumentar também alíquota da COFINS em três pontos percentuais, para 10,6% sobre a receita bruta.
O senhor vê a futura legalização dos jogos de azar online, apostas esportivas, jogos virtuais, esportes e outras opções de jogos remotos e móveis possíveis? Como explorar a paixão brasileira pelo esporte nesse sentido?
A pandemia realçou ainda mais a realidade de que o mundo passou a fazer mais coisas de maneira remota, dentro de suas próprias casas, apenas com conexões a Internet e seus celulares, computadores, etc. Nesse contexto, as apostas online já são uma realidade no Brasil, que estimo movimentam cerca de R$6 bilhões ao ano, com forte tendência de crescimento. Por isso, é de extrema importância que haja a legalização e a regulamentação infralegal desses jogos, para que os próprios empresários tenham a liberdade de gerir os seus negócios da forma que achem mais interessante, e que o Estado também colha os frutos dessa renda e dos esses empregos gerados. Embora esteja tratando apenas de jogos de fortuna, os jogos de habilidade também devem ser pensados para uma regulamentação, apoio e promoção.
Como o senhor imagina que o jogo no Brasil irá evoluir nos próximos três a cinco anos, levando em consideração o forte mercado interno e o grande interesse de operadoras e fornecedores internacionais em entrar nele?
O Brasil tem um potencial enorme. O setor mesmo que ainda sem legalização já supera o 0,5% do PIB. Estimo que nos cinco anos após a regulamentação dos jogos, esse número possa chegar em torno de 1,5% do PIB. Mas isso depende de muito trabalho, vontade política e segurança do investidor de que as regras serão claras para as suas inversões no país. É preciso um modelo de autorização em normas infralegais do Poder Executivo, em que a divisão dos riscos, após o pagamento das outorgas, seja justa para as duas partes (Governo e empresa), de modo que as restrições legais e ambientais não afugentem esse potencial de geração de empregos.
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