Por Anamaria Bacci, jornalista e tradutora da G&M News.
Doutor em Economia pela Universidade de Brasília e servidor de carreira do Banco Central do Brasil, Gustavo Guimarães enfrenta o desafio da nova onda reguladora de jogos e apostas em todo o país, além de controlar o lançamento das novas loterias estaduais e a LOTEX. Espera-se que uma de suas prioridades seja finalmente colocar em funcionamento o mercado regulado de apostas esportivas no Brasil. Conforme acertado em dezembro de 2020, a SECAP-ME terá como foco a administração, regulamentação e controle das novas loterias estaduais, surgidas após a decisão do Supremo Tribunal Federal em 30 de setembro, com publicação oficial no final do ano. Nesse sentido, a SECAP está preparando um documento técnico para unificar os critérios reguladores, garantir a transparência, estabelecer limites de prêmios, impostos e serviços, e desenvolver uma concorrência justa, boa administração e proteção de grupos vulneráveis. Além disso, serão estabelecidas normas contra lavagem de dinheiro, divulgação de balanços e outros mecanismos de segurança.
Você é um verdadeiro especialista em economia. Qual o conhecimento que você tinha sobre a indústria de jogos e o segmento lotérico no Brasil? Que aspectos deste setor lhe interessam?
A regulação de loterias, como competência institucional do Ministério da Economia (ME), é um assunto que têm reflexo transversal nas demais atividades da Pasta Ministerial. Sendo assim, em minha trajetória recente na Secretaria Especial de Fazenda, era frequente o tema surgir entre as diferentes demandas que eram tratadas nas interações com o Gabinete do Ministério da Economia ou com as demais áreas do ME. Temos interesse em viabilizar uma ampliação segura e saudável do mercado para gerar renda, emprego e arrecadação, com consequente aumento dos repasses de recursos para programas e políticas públicas governamentais, tendo em vista o potencial significativo de crescimento que o setor de loterias e jogos de azar pode alcançar no Brasil.
Nos últimos dois anos, houve um importante avanço na regulamentação do jogo no país. Como a SECAP, por meio de documento técnico que está elaborando, pode unificar critérios regulatórios, garantir transparência, oportunizar a todos os stakeholders do mercado e proteger grupos vulneráveis?
A busca por um marco regulatório moderno e aderente às melhores práticas internacionais para o setor de loterias é uma constante nas atividades da SECAP. Além disso, a diretriz estabelecida hoje em nossa Secretaria é que tais assuntos, considerando a sensibilidade operacional e a complexidade regulatória envolvidas, sejam alicerçados principalmente na ampliação sustentável do setor, na responsabilidade social corporativa, em especial, o Jogo Responsável, e na maximização de valor decorrente da exploração desses serviços públicos. Com isso, tanto nossos normativos de regulação quanto os requisitos técnicos das ações de desestatização em curso, o planejamento, e os estudos que embasam a ampliação de mercado, terão como norte a proteção do público apostador, dos interesses da sociedade brasileira e a liberdade de atuação e inovação para os atuais e futuros operadores de loterias no Brasil.
Como você estima que o mercado de apostas esportivas administrado pelas loterias estaduais brasileiras crescerá e se fortalecerá? No caso de São Paulo, o senhor concorda com a decisão do Governador local de criar uma Loteria Estadual para financiar as políticas sociais daquele Estado?
A respeito desse tema, não nos cabe qualquer comentário sobre os atos adotados por qualquer um dos entes federativos. Especificamente sobre o mercado brasileiro de apostas esportivas, podemos apenas nos limitar às ações em curso, que seguem as determinações do Poder Executivo, que incluiu esse serviço público no Programa Nacional de Desestatização. Posso registrar aqui que tais ações estão sendo conduzidas de forma efetiva, em uma ação estratégica do governo brasileiro, envolvendo o Ministério da Economia e o BNDES. Com isso, nossa expectativa é completar as etapas de planejamento, análise de mercado e modelagem no início do próximo ano e finalizarmos, com consistência e de maneira aderente, ao que se desenvolve nos grandes mercados internacionais, a regulamentação dessa atividade no país.
Por que duas grandes empresas internacionais como a Scientific Games e a IGT abandonaram a licitação da LOTEX? O que acontecerá com a premiação desta loteria instantânea?
O consórcio Estrela Instantânea S.A., formado pelas empresas IGT e Scientific Games, foram vencedores do leilão de 2019 para a concessão da LOTEX. Entretanto, o consórcio não cumpriu a integralidade das condições previstas no edital, não tendo sido assim celebrado o contrato de concessão. As motivações e justificativas para a não assinatura do contrato cabem às empresas em questão. Quanto ao governo, podemos dizer que retomamos as atividades relacionadas à LOTEX, o que deve resultar em revisão e atualização da modelagem da desestatização desse serviço público, com o objetivo de termos, em breve, a comercialização de loterias instantâneas em todo território nacional, de maneira segura, íntegra e segundo os parâmetros de jogo responsável.
Como se desenvolve o trabalho conjunto da SECAP com a Caixa Econômica Federal? De que forma o Secretariado pode contribuir para o fortalecimento das 13 mil casas lotéricas presenciais da rede da Caixa?
A relação entre a SECAP e a Caixa Econômica Federal (CEF) é estritamente conduzida dentro do que se espera de uma relação eficaz entre órgão regulador e entidade regulada na operação de serviço público. Tendo como essência o objetivo de crescimento do setor no Brasil, na condição de regulador, buscamos viabilizar os pleitos e as iniciativas de modernização da CEF. Por sua vez, reconhecemos que a CEF administra as Loterias Federais, em nome da União, com qualidade, ao longo de quase 60 anos. Ademais, os números do início do ano mostram quão significativos são os valores envolvidos na operação de loterias. Nosso 1º Relatório do Mercado Brasileiro de Loterias, publicado no mês passado, mostrou que as loterias federais geraram R$ 2,74 bilhões em arrecadação no primeiro quadrimestre de 2021, o que representa um crescimento de 13% em relação aos R$ 2,42 bilhões repassados durante o mesmo período de 2020. Tais números denotam a melhoria contínua na gestão das loterias federais, tanto por parte da Caixa Econômica Federal quanto pela atuação da rede lotérica e dos empresários que a administram, que, mesmo em meio a pandemia, apresentou um resultado de vendas expressivo.
Qual é a sua perspectiva futura sobre a evolução regulatória de todas as verticais de jogos no Brasil?
Tenho convicção que as loterias são a grande referência e o termo de comparação para qualquer movimento de abertura do mercado brasileiro de jogos de azar. A partir do que estiver sendo praticado nas loterias federais, em relação aos requisitos regulatórios, que são segurança, integridade, fiscalização e controle, prevenção a fraudes, jogo responsável e prevenção à lavagem de dinheiro, é que teremos o patamar mínimo para que se possa avaliar e discutir a expansão de jogos de azar no Brasil. E, seguramente, a SECAP terá um papel de protagonismo nesse contexto.
Como economista, quais benefícios você acha que essa indústria trará em termos tributários para o Estado brasileiro? Como você estima que as empresas internacionais poderão ingressar e investir neste grande mercado?
A partir da experiência das Loterias Federais, é importante destacar a potência fiscal advinda de loterias e demais jogos de azar. Na evolução do setor que estamos perseguindo, com as Apostas de Quota Fixa e a LOTEX, isso ficará mais evidente, com recursos a serem auferidos pela União na condição de outorgas ou licenças, a depender da modelagem das concessões. Por fim, além dos recursos diretos gerados ao Estado brasileiro, a expansão do mercado nacional de loterias possui uma alta atratividade para fortes investidores, que hoje atuam nos grandes mercados internacionais e que por diversas ocasiões manifestaram interesse no mercado brasileiro. Com isso, entendemos que será consequência natural da expansão do setor de loterias e, eventualmente, dos jogos de azar no Brasil, se essa for a decisão do Congresso Nacional e da sociedade brasileira, a reversão de valores consideráveis para a sociedade, por meio dos repasses sociais, além de um crescimento dos atores envolvidos na operação de loterias, trará consigo o aumento da oferta emprego e incremento de renda para a população do país.
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