O termo Esports ou desporto eletrónico tem sido utilizado, desde o seu surgimento, como sinónimo de competições organizadas de videojogos. É digno de relevo o facto de conter o termo sport/desporto. A trote desta designação tem sido mais fácil introduzir a discussão sobre se devem ou não ser considerados um verdadeiro desporto, tanto mais que a sua exibição convoca, à semelhança dos desportos tradicionais, grandes massas, qualificações finais, campeonatos e, ainda, apostas (desportivas). Esgrimem-se argumentos a favor e contra, invocando-se (entre outros muitos argumentos) e daquele lado, a motricidade fina/habilidade motora exigida pelos Esports, e deste lado, a falta de esforço físico.
A necessidade de comparação entre o desporto e os Esports resulta, também, do desejo implícito destes afastarem os estigmas que lhe têm sido associados, por muitos, e desde o seu surgimento, a saber, o sedentarismo, o isolamento, o vício e a violência presente na temática dos jogos. Decorrente destes traumas de infância e da elevada expectativa de serem classificados como desporto, muito tem sido discutida a sua integração nos Jogos Olímpicos. E eis que o COI anunciou muito recentemente e quase em cima do acontecimento -a começar a 13 de maio- a criação de uma Olympic Virtual Series (OVS), que precederá o início dos Jogos Olímpicos de Tóquio. O termo utilizado é expressivo e, crê-se, pleno de significado. Com efeito, estarão presentes neste primeiro evento virtual cinco modalidades desportivas tradicionais, sob a égide e autoridade das respetivas federações desportivas internacionais. Note-se que não foi anunciado um Olympic Esport Series. Com efeito, encontram-se excluídos deste evento os Esports mais populares e mais comumente associados a esta designação, como sejam os League of Legends ou o Counter-Strike. Ao invés, os atletas irão competir em jogos como o basebol, ciclismo, remo, vela e automobilismo. E de futuro, outros se perfilam a entrar na OVS, como sejam o futebol e basquetebol.
UM LENTO PROCESSO DE RECONHECIMENTO E INTEGRAÇÃO
Para alguns, trata-se de um primeiro passo no reconhecimento dos Esports como desporto e como modalidade olímpica, mas não podemos deixar de pensar que também pode ser encarado, precisamente, no sentido contrário. Ou seja, os virtual sports escolhidos têm como tema desportos reais, e desportos estes praticados no seio de uma federação desportiva. Trata-se de uma perspetiva bem diferente de se considerar a prática de Esport, em si e por si, como desporto. Ou seja, não se trata de admitir que a prática dos Esports é equivalente à prática de um desporto, mas apenas de admitir, num evento olímpico, Esports que reproduzem, virtual/eletronicamente, um desporto real. Consequentemente, a intenção não será classificar os Esports como desporto, mas sim de tentar levar o desporto para o mundo dos Esports.
Assim, a escolha daqueles específicos jogos poderá antes constituir uma tomada de posição quanto à exclusão, em eventos olímpicos, de todo e qualquer Esport que não tenha conexão com uma modalidade desportiva e com uma federação. Semelhante posição já tinha sido inicialmente veiculada, aliás, pela autoridade olímpica alemã, que diferenciava os desportos virtuais -a admitir-, como o FIFA, PES ou NBA, de outros que deveriam permanecer no mundo do iGaming, como sejam Counter-Strike, DotA 2, League of Legends, Fortnite, Call of Duty, Overwatch, etc.
CRIE UM ESPAÇO DE INTERCÂMBIO PARA ALCANÇAR OS JOVENS
Estas posições vêm trazer à tona algo que transcende a discussão inicial, ou seja, para além de se discutir a classificação dos Esports como desporto, aqueles virão a ser objeto de uma subdivisão? As reações ao evento anunciado pelo COI fazem-se ouvir, contestando-se a ausência dos Esports mais populares, alegando muitos que os Esports não precisam dos Jogos Olímpicos (para continuar o seu crescimento vertiginoso), mas que o inverso, não é verdadeiro. Com efeito, um dos objetivos do COI é, entre outros, aumentar o interesse no desporto: “O OVS cria um espaço para conectar o mundo do esporte físico com a comunidade de jogos esportivos virtuais e de simulação, proporcionando uma oportunidade de se envolver com o Movimento Olímpico e alavancar a popularidade crescente do esporte virtual para promover o Movimento Olímpico, os valores olímpicos e a participação esportiva, e crescer relações diretas com os jovens”. (a)
E o que tem tudo isto a ver como o jogo a dinheiro? O mercado de apostas está atento e a receber este evento com grande expetativa, reconhecendo que a credibilidade dos Esports é reforçada e aumentada a sua visibilidade. (b) O que se repercute favoravelmente, claro, na indústria das apostas. Muito mudará nos próximos quatro anos e, no mundo virtual, as mudanças nunca param. Certo é que o Esports não esperarão, pelos quatro anos que separam os próximos Jogos Olímpicos, para continuar a crescer e a evoluir. Legisladores e reguladores, quer do mundo do desporto, quer do jogo a dinheiro, esses sim, têm muita dificuldade em acompanhar estas mudanças.
Para terminar, e numa outra perspetiva, há quem preconize que os Esports/desportos virtuais serão o próximo caminho para a dinâmica de parques temáticos, nomeadamente infantis, permitindo até a inclusão de crianças portadoras de deficiência. (c) Certo é que, nas crianças, com o avanço da idade, há uma tendência para diminuir a prática de desporto físico e aumentar a prática de Esports. A questão fulcral é acompanhar esta tendência ou combatê-la.
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Notas de rodapé:
(a) https://olympics.com/ioc/news/international-olympic-committee-makes-landmark-move-into-virtual-sports-by-announcing-first-ever-olympic-virtual-series na senda, aliás, da Agenda Olímpica 2020+5.