Por Anamaria Bacci, jornalista e tradutora da G&M News.
Fale um pouco da sua experiência na indústria do jogo, como foi que você começou no ramo? Onde você está atuando exatamente?
Eu venho da indústria de oil & gas, onde desempenhei funções relacionadas com relações internacionais e governamentais em mercados mais complexos ou que apresentam alguns desafios, como era o caso de África. Mas na verdade, o meu coração sempre este com a América Latina. Quando surgiu a oportunidade de me juntar a equipe da Clarion Gaming, não hesitei. A sinergia com a empresa e a equipe foi imediata. Foi nesta altura, que depois de escutar a indústria, seus desejos e necessidades, decidimos em 2013 lançar o BgC-Brazilian Gaming Congress no Rio de Janeiro e, mais tarde, Juegos Miami. Ao longo destes anos, acabei por me imergir totalmente no mundo dos jogos na América Latina e Caraíbas. Para apresentar o alto nível de inteligência e apoio à indústria, existe uma necessidade de constante comunicação com todo o espectro do mercado, como legisladores, reguladores, operadores, provedores, entidades da indústria, etc. Hoje, continuo a acompanhar e a trabalhar proximamente com os nossos parceiros, quer no Brasil quer na América Latina em geral, e a desenvolver atividades que tomarão lugar em 2021 e 2022, incluindo eventos presenciais. Claro que o meu foco está em toda a América Latina, mas entenda-se que também está em toda a segmentação da indústria, desde a modernização de loterias, a reabertura dos casinos ou iGaming até aos Esports ou afiliados.
Como você vê a situação atual do jogo em mercados importantes como Estados Unidos e América Latina? Em ambos os territórios, a legalização das apostas desportivas e do iGaming está a progredir. Que aparência você tem sobre isso?
Positiva, são tempos empolgantes para ambas as regiões. O mercado global das apostas esportivas online foi avaliado em US$53,7 bilhões em 2019 e deve crescer a uma taxa anual de 11,5% entre 2020 e 2027. A meu ver, a América Latina, após a Ásia, é o mercado mais emergente para os próximos anos, mas claro que não podemos ignorar a regulamentação a decorrer nos Estados Unidos. Vários Estados no Estados Unidos da América estão a regulamentar as apostas esportivas e iGaming, o que é excelente, pois eu sou apologista que qualquer jurisdição com uma estrutura regulamentar forte e saudável, ganha o estado, o jogador e a sociedade. As apostas online ganham cada vez mais espaço na indústria do esporte. Prova disso são os inúmeros estudos a respeito da modalidade que mostram que ela irá crescer significativamente nos próximos anos. A Spectrum Gaming Group está bastante envolvida na regulamentação das apostas em vários Estados dos Estados Unidos da América. Em solo estadunidense, mais de US$20 bilhões foram apostados nesse segmento desde que a Suprema Corte liberou as apostas esportivas nesse país em 2018. Após a liberação, 18 Estados (que representam pouco mais de 30% da população dos EUA) regulamentaram os mercados de apostas esportivas. Desses 18, 12 Estados aprovaram as apostas esportivas online em grande escala. Para termos uma ideia da força das apostas online no mercado estadunidense, 84% das apostas realizadas no Estado de Nova Jersey em 2019 foram feitas online. Prevê-se que o mercado dos EUA gerará quase US$7 bilhões em receitas até 2025! A situação na América Latina é muito empolgante, pois existe uma forte penetração de Internet e vemos vários países a avançar com a legislação e regulamentação das apostas esportivas e iGaming, seguindo o exemplo da Colômbia, como o caso do Peru, Chile, várias províncias na Argentina e outros. Não esquecendo claro o Brasil, que se encontra no período de regulamentação das apostas esportivas online e land-based. Após a adoção de novas leis no Brasil e na cidade de Buenos Aires, na Argentina, em dezembro, o mercado de jogos de azar online na América Latina se tornou estratégico. Penso que as apostas esportivas no Brasil chegarão a marcas bilionárias de faturamento, com um mercado de apostas esportivas que, após amadurecido, pode alcançar um valor de 1.560 bilhões de dólares sob medidas regulatórias favoráveis.
Qual a sua opinião sobre a regulamentação do jogo no Brasil? Acha que o Brasil está atrasado pelo fato de ainda não ter regulamentado os games?
É impossível dizer o contrário! Acho, sim que o Brasil está atrasado em relação à regulamentação dos jogos. O Brasil tem dimensões continentais e jogo é uma realidade, embora na clandestinidade. É o que abre portas para coisas como o crime organizado. Se não é uma atividade regulamentada não é controlada, e penso que existe essa necessidade urgente, pois não só para o Governo e a sociedade poderem usufruir de seus benefícios monetários, mas também de segurança. Estima-se que o mercado brasileiro de jogos movimenta US$20 bilhões ao ano, mas introduzindo cassinos, por exemplo, com os valores das taxas somados aos 20 bilhões, chegaria ao montante de 63 bilhões de reais ao ano. Isso representa cerca de 1% do PIB do Brasil, o que é muito. A média da tributação mundial do jogo é de 30%, o que daria ao Brasil uma arrecadação anual de R$18,9 bilhões em tributos com este setor, sem contar as outorgas e taxas (já para não falar no turismo que geraria). No entanto, já vemos diversos avanços, com a legislação das apostas esportivas em dezembro de 2018, com a reabertura das loterias estaduais, com as discussões ativas nas câmaras legislativas e com o amicus curae que tomará lugar no STF em sete de abril. Isto se refletiu no BgC também. Desde o lançamento do BgC-Brazilian Gaming Congress em 2013, muito mudou. O conteúdo das discussões durante o nosso primeiro evento foi sobre ‘Por que o Brasil deve legislar e regulamentar os jogos de sorte e azar?’. Mas se olharmos para os nossos dois últimos eventos, BgC VII e BgC VIII, o discurso é totalmente diferente. Evoluímos de por que regular, até apresentar debates entre os legisladores brasileiros, debater as melhores práticas internacionais em apostas esportivas, cassinos, impostos, jogo responsável, inovação em loterias. Enfim, a conversa evoluiu bastante e hoje foca-se nas modalidades de jogo devem ser regulamentadas e como. O Brasil é um país com uma legislação complexa, burocrática e muito demorada, e penso que temos de ser pacientes e respeitar a forma de como as coisas são. O avanço é lento, mas existe um avanço sem dúvida alguma. Tanto a Clarion Gaming quanto eu pessoalmente continuaremos a apoiar os legisladores, reguladores, executivos e as entidades envolvidas neste processo sempre que possível.
Em relação à Clarion Gaming, de que forma a empresa se reconverteu para ser uma organizadora de eventos omnicanal? Como você imagina um evento face a face no novo normal pós-COVID-19 no futuro?
A Clarion Gaming já desenvolvia atividades paralelas para além de organizar os eventos presenciais pelos quais somos mais conhecidos; será que aceleramos o passo em relação a alguns planos, acho que sim. Mas apenas expandimos a nossa oferta especialmente no que diz respeito a conectar a indústria, tornamo-nos mais criativos! Como trabalhamos com todas as vertentes do mercado, conversamos com legisladores, reguladores, operadores, provedores, associações, bancos e investidores para responder melhor às suas necessidades e cobrir todo o espectro da indústria. Este foi um desafio que adoramos. Sem dúvida, o apoio incondicional de toda a indústria a nível mundial foi essencial para podermos colocar a seu dispor a ICE 365. Embora a ICE Londres (principalmente) é o evento que toda a indústria espera ano após ano, e em 25 anos foi a primeira vez que foi adiada, é onde toda a indústria se reúne e onde todas a novidades são reveladas. Mas a ICE não se resume a apenas uma semana. É um evento que se reflete nos restantes 365 dias do ano e foi isso que colocamos em prática. A seu tempo, a Clarion Gaming apresentará os procedimentos de segurança para o evento do próximo ano, mas não tenho dúvida alguma de que a ICE Londres 2022 será um evento inesquecível!
No que diz respeito ao Spectrum Gaming Group, a consultoria elaborou um relatório no qual destacou os possíveis avanços do mobile gaming em Nova Iorque. Que valor você atribui a esse processo nesse mercado e ao uso crescente de dispositivos móveis para jogos?
Nos últimos anos, o Spectrum Gaming Group tem realmente atuado no espaço regulatório de apostas esportivas do ponto de vista da consultoria. Antes do lançamento das apostas esportivas em Rhode Island, a Spectrum escreveu um RFP para a Loteria de Rhode Island sobre as qualificações necessárias para se tornar o provedor de serviços de apostas esportivas do estado. Fomos autores de um relatório sobre os prospectos para apostas esportivas no Distrito de Columbia meses após a decisão da Suprema Corte PASPA. Além disso, desenvolvemos muito recentemente um estudo aprofundado para o Estado de Nova Iorque, o mercado maior desta nação, estimando que o mercado combinado de apostas esportivas (digital e retail) pode gerar entre US$816 milhões e US$1.14 bilhões em GGR (Annual Gross Gaming Revenue). Tal como a G&M News menciona, o uso de dispositivos móveis é crescente e a Comissão de Jogos de Nova Iorque vai submeter um RFP para selecionar um ou mais fornecedores para oferecer apostas esportivas móveis no Estado de Nova Iorque. Neste Relatório, a Spectrum baseou sua metodologia na estimativa anual por adulto do GGR de US$50 a US$70 em todo o país. O cálculo é ajustado mediante a renda familiar e população em cada Estado. De acordo com o U.S. Census Bureau, a renda média familiar em Nova Iorque é de cerca de US$65.323, cerca de US$3.400 mais alto do que a média dos EUA. Nova Iorque tem uma população total de 19,9 milhões, a quarta maior do país, com cerca de 15,5 milhões de adultos em idade de jogo. Como resultado, descobrimos que as estimativas do GGR por adulto se traduzem em uma faixa de US$53 a US$74 para Nova Iorque. Nosso estudo assume uma taxa de imposto de 10% sobre apostas esportivas GGR, resultando em receita fiscal anual de US$104 milhões sob uma visão mais positiva. Sob uma previsão mais conservadora, a Spectrum estima que Nova Iorque traria cerca de US$74 milhões por ano de impostos sobre apostas esportivas. É importante notar que a Spectrum não incluiu uma previsão sobre a quantidade de receita que as apostas esportivas móveis poderiam gerar para Nova Iorque sob um modelo estadual. O modelo pode se comparar favoravelmente a um em New Hampshire, onde a loteria estadual concedeu um contrato exclusivo a um operador de apostas esportivas móveis. Nesse sistema, o operador paga 51% da receita bruta de jogos de seu canal móvel para o Estado em troca de exclusividade para o mercado online do Estado. Alternativamente, a comissão de jogos poderia contratar com uma combinação dos quatro sportbooks que já fazem parcerias com cassinos comerciais no norte de Nova Iorque. Enfim, extremamente interessante e fascinante.
Uma pesquisa recente da Ampersand Bellwether Report (Clarion) mostrou que os executivos de jogos veem a evolução da indústria com um olhar otimista e acreditam que haverá um progresso significativo no segmento de jogos online e uma diminuição na receita do jogo presencial. Que análise você faz sobre essas tendências?
Ewa Bakun, a Responsável por inteligência da indústria da Clarion Gaming, e de certa forma a minha mentora no mundo dos jogos. Organiza regularmente discussões Ampersand fascinantes via Zoom e quando for possível, novamente presencial. Aliás, dia 17 de março, às 15:30 GMT (10:30 ET), acontecerá uma conversa Ampersand Virtual enfocada na ‘Expansão para Novos Mercados’, parte da ‘Série Sportsbetting’ da Clarion Gaming. Ampersand Bellwether Report, com base na pesquisa realizada entre novembro e dezembro de 2020 com membros da Ampersand, divulgada no início de 2021, foi o segundo relatório publicado durante a pandemia. Mostrou um otimismo crescente dentro da indústria, com 77% se sentindo otimistas sobre os prospectos de suas organizações, contra os 44% de março a abril de 2020. Houve, de facto, diferenças significativas entre os entrevistados ligados ao mercado online e do land-based, o que reflete a continuação, embora acelerada devido à pandemia, da tendência de mudança para online, com muitos apontando a regulamentação dos jogos online como uma das maiores oportunidades. A discrepância entre a forma como os executivos de jogos online veem a indústria avançando contra a visão mais pessimista do setor do land-base não é surpreendente, considerando o impacto que a pandemia teve nesses setores, devido a paralisação de instalações de jogo físico e o crescimento do online.
Em relação aos projetos para este ano, a Clarion Gaming anunciou a série ICE 365, bem como um trabalho que terá como foco as apostas esportivas (março), Esports (abril), cassinos (maio) e mercados emergentes, com eixo no Brasil (junho). O que você pode nos contar sobre essas iniciativas importantes para 2021?
Estamos entusiasmados em apresentar esta maneira completamente nova para obter os insights críticos para os negócios e para permanecer na vanguarda da indústria: a ICE 365. Estamos redirecionando a incrível experiência ICE para se adequar ao clima atual e estamos comprometidos em trazer todas as ferramentas que a indústria precisa para avançar e ter sucesso. A série de conteúdos da ICE 365 fornece insights e análises multimídia durante todo o ano, divididas em temas, todos disponibilizados em uma plataforma para apoiar toda a indústria de jogos de azar. Essas séries combinam elementos da análise, dados e webinars com as conexões, eventos e palestras virtuais da Clarion Gaming para fazer uma análise aprofundada sobre os principais problemas enfrentados pelo setor. Cada série terá uma vertical, tópico ou subtópico do setor global de jogos e fornecerá ferramentas estratégicas e práticas para o futuro de cada negócio, com insights em uma variedade de formatos, tais como: relatórios, entrevistas, dados exclusivos, vídeos e webinars, debates e/ou mesas redondas ao vivo, sessões de networking ou Masterclasses. É conveniente realçar que a América Latina será bem enfocada nesta série de segmentos. Começaremos já em 31 de março com um debate ao vivo acerca da importância dos retailers. No início, ainda parte da série Esports focaremos o ‘Boom de jogos alternativos’ e a conexão entre iGaming e Esports. Teremos na série cassinos um webinar muito interessante enfocado na ‘Recuperação dos cassinos e o impacto financeiro’ e, claro, haverá muitas surpresas na série enfocada nos mercados emergentes, onde América Latina terá um lugar primordial. Estou ansiosa por poder partilhar todas estas iniciativas com o mercado de jogos da América Latina e do Caribe, mas com a comunidade internacional também, que acompanha atenciosamente a região.
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